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Carlinhos Queiroz, carinhosamente conhecido como o “Mestre dos Magos,” aponta que as religiões funcionam como sistemas mercadológicos estruturados em três engrenagens fundamentais: 

  • Divindade(s);

  • Sacerdote(s), ou especialistas da religião;

  • Devotos.

Mas sua análise não para aí. Ele denuncia que, na dinâmica mercadológica das religiões, os sacerdotes operam como empreendedores e os devotos como clientes. A relação de devoção é transformada em uma interação mercantil, em que os devotos buscam dobrar o ídolo às suas vontades, enquanto os sacerdotes garantem o sucesso dessa transação espiritual.

Nesse sistema, o sacerdote, ou “empreendedor sagrado”, assume o papel especial de intermediário, dotado de poder “sobrenatural” e conhecimento sobre o que é “sagrado,” prometendo que os desejos dos devotos serão atendidos. E, de forma irônica, quanto mais o ídolo perde a própria autonomia e depende da mediação do sacerdote, mais perigosa essa relação se torna. Afinal, em muitos casos, o ídolo funde-se com a vontade do sacerdote, e assim o deus-empresário surge, exigindo fidelidade e punições para quem o questiona.

Um deus que pensa por si, que não pode ser manipulado pelos especialistas da religião nem pelos seus seguidores, não é exatamente um produto atraente. Uma divindade que convida seus seguidores a serem críticos do mundo ao redor e a agirem de forma subversiva dificilmente sustentará um negócio lucrativo.

Por isso, o mercado da fé busca criar um produto estável, previsível – um ídolo que não cause problemas para quem o manipula. Há uma necessidade de moldar um ídolo perfeito: maleável, lucrativo, sem surpresas. E assim, qualquer evidência de uma divindade viva, com espírito próprio, deve ser silenciada e eliminada.

***

Nietzsche havia denunciado a humanidade: temos o sangue divino em nossas mãos. Como em qualquer crime, há sempre um motivo que ajuda a compreender um ato tão hediondo. E, assumindo o papel de detetive nesse caso enigmático, deixo aqui minha impressão.

‘O homem louco se lançou para o meio deles e trespassou-os com o seu olhar ‘Para onde foi Deus’, gritou ele, ‘já lhes direi! Nós o matamos – vocês e eu. Somos todos seus assassinos!

Nietzche, em A Gaia Ciência.

Ao declarar a morte de Deus, Nietzsche faz uma leitura brilhante da sociedade de sua época. Um leitor desatento, ou mal-intencionado, poderia ver essa frase como o grito triunfante de um homem ateu e desalmado. Mas precisamos ir além disso e refletir sobre a profundidade e o impacto dessas palavras tão marcantes.

O filósofo estava, na verdade, declarando o fim da modernidade. Para Nietzsche, a religião havia sido uma pedra fundamental para o desenvolvimento da sociedade até então, mas ele via um momento em que a humanidade não a considerava mais necessária para o progresso. Como uma criança que, ao aprender a andar de bicicleta, não precisa mais das rodinhas, a humanidade teria finalmente aprendido a andar sozinha, sem o apoio da crença religiosa. Declara-se, assim, o fim da metafísica e da modernidade. O ser humano, em certo sentido, teria transcendido suas limitações e não precisaria mais do sobrenatural para orientá-lo na história.

Para o homem moderno, Deus já não supria suas necessidades. Como mencionei na newsletter anterior, com a ciência e a tecnologia, o ser humano alcançou desejos que antes depositava nas divindades. Então, qual seria agora a necessidade da religião?

Como Freud afirmou, a ciência e a tecnologia não conseguiram extinguir o mal-estar da sociedade — E acredito que nem tampouco a necessidade de uma religião. Apesar das tentativas de superar os caminhos religiosos no coração humano, ainda aplicamos seus mecanismos ao mercado e aos elementos que compõem a sociedade, basta olhar atentamente. As redes sociais, por exemplo, funcionam como uma grande organização religiosa: os “sacerdotes” prometem glória e muitos seguidores, enquanto os “devotos” oram ao deus-algoritmo para serem abençoados em seus projetos.

Um aspecto interessante a se considerar é a evolução do “ídolo-produto” ao longo da história humana. Deus não funciona como produto. E, aparentemente, a fé na ciência começa a perder sua força. Surgem, então, novas necessidades, novos ídolos e totens a serem adorados. A tecnologia torna-se a nova esperança dos empreendedores religiosos, com divindades modernas, como o algoritmo, que oferecem muito mais estabilidade e controle do que qualquer modelo anterior.

Outro aspecto crucial é a natureza da relação de escravidão com o ídolo. O empreendedor nunca desejou um ídolo com vida própria; pelo contrário, quanto mais controlado, melhor para o negócio sagrado. As novas tecnologias, por isso, assumem perfeitamente o lugar dos ídolos: são controladas 100% pelo sacerdote e, ao mesmo tempo, geram a ilusão de autonomia. Esse cenário é perfeito, pois o ídolo-sacerdote perde seu poder de persuasão com o tempo, à medida que as mentes se tornam mais críticas às suas manipulações. Assim, a aparente separação entre o ídolo e o sacerdote se faz necessária. O cliente não deve, em hipótese alguma, suspeitar que ambos podem ser um e o mesmo.

Achados nas interwebs

☕️
Sala de espera é uma playlist que combina músicas que me inspiram enquanto continuo na caminhada, especialmente enquanto espero. Atualizo a playlist sempre então vale a pena seguir! :)

🎙️
O livro Em Busca da Espiritualidade, de Carlinhos Queiroz, explora o que significa viver uma espiritualidade autêntica e profunda, enraizada em uma relação genuína com Deus. Queiroz apresenta a espiritualidade como uma jornada de transformação interior e prática diária, enfatizando que não se trata de uma série de rituais ou regras, mas de um processo de conhecer a si mesmo e ao Divino.

❤️
Você é Aquilo que Ama de James K. A. Smith mostra como nossos desejos moldam quem somos. Ele afirma que o discipulado deve focar em reorientar nossos amores e hábitos, não apenas em transmitir conhecimento.

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